Tenta me pedir pra guardar um número. Pode ser senha de banco, de cartão, data de nascimento, placa de identificação, qualquer treco parecido. Tem número, tô fora. Cinco minutos depois já não me recordo.
Agora experimenta me mandar ler alguma coisa: vou prestar atenção, vou reler mil vezes, vou pensar sobre aquilo, vou encontrar erro, vou sugerir melhoria, vou guardar para sempre.
Letras, sempre as amei. Separadas já são incríveis, juntas então, capazes das maiores façanhas – para o bem ou para o mal. Para o bem: comunicam intenções, esclarecem dúvidas, traduzem sentimentos, fazem acordos, expressam desejos e sonhos. Para o mal? Para o mal as mesmas questões, apenas com outros propósitos.
Não sou poetisa. Mas fazer o quê? Preciso arriscar uns versos sem rima. Tem poesia em tudo. Só não vê quem não quer.
Não sou escritora, mas amo brincar com as palavras para fazer refletir e imaginar – melhores propriedades de um texto, de uma crônica, de um livro inteiro.
Gosto de narrar o cotidiano. Adoro escutar as pessoas e me apropriar de suas expressões engraçadas e ideias originais, só pra me deliciar em saber que se procuram – ou se reconhecem – nos meus scripts.
Prefiro o argumento leve, fácil, coloquial e simples. Prezo pela escrita que parece um bate-papo com um amigo: bem humorada, livre, porém cheia de significados (óbvios ou subliminares).
Um estilo? Depende. Do dia, da trama, do motivo. Tenho dificuldade em criar sobre o que não passe pelas minhas emoções ou viva no cotidiano. Não consigo nada fake, nem inventado. Fica distante. Falo sobre o que percebo, o que protagonizo. Converso sobre o que quero botar pra fora e esgotar – pra partir em busca de outra matéria. De preferência à moda antiga: com esferográfica e papel.
Quando me manifesto sobre episódios espinhosos ou sofridos é por pura revolta, vontade de convidar pra mudança, indignação, combate à impunidade. Me encanta mesmo é transformar dificuldades em situações engraçadas. Mas nem sempre dá, porque a vida real tá mais pra montanha russa do que pra carrossel.
Eu pensava que escrever fosse mais fácil. Achei que era só falar sobre um assunto, com um pouco de criatividade, e estaria tudo certo. Puro engano. Escrever, à sério, com público, exige muita responsabilidade e cuidado com a forma, com o conteúdo, com o outro, apesar das “licenças” que vivo a me permitir.
Talvez eu ande incentivando a escrita e a leitura neste mundo de vloggers e youtubers. Já percebo umas linhas traçadas por quem nunca tinha se atrevido antes. E creio que esteja agradando porque, vire e mexe, lá vem uma sugestão: “escreve sobre isso”, “usa nas crônicas”, “faz virar tema”. Por isso, pra vocês, que incentivam, me arrumei uma descrição: não virei cronista, não virei blogueira, não virei autora, virei escrevinhadeira.
Kátia Galvão em 50etcetera